Pode parecer a alguns mais apressados na análise que falar de política em termos individuais é algo impraticável já que política diz respeito ao coletivo. Já da raiz grega “polis”, que era a palavra que designava a cidade, a coletividade, a noção de política é, de fato, coletiva. Ocorre que, quando se fala de política pessoal, a noção é a da postura de qualquer indivíduo perante o restante da sociedade. Nós somos seres sociais, mais do que individuais, então faz sentido que pensemos em política pessoal, que, no fundo, é a postura política do indivíduo perante o grupo.
Na vontade de nos conhecermos melhor, temos que verificar sempre o que fazemos nos grupos sociais em que atuamos. Uma das questões mais viciadas no relacionamento entre as pessoas diz que a primeira pergunta a ser feita, quando conhecemos alguém, é o nome da pessoa, para, logo em seguida, perguntarmos a atividade profissional que ela tem. Interessa-nos saber o nome para não confundirmos a pessoa e o que ela faz. Pouco interessa perguntar se a pessoa é feliz e se colabora socialmente para a felicidade do mundo. Essas questões são as mais importantes.
Para que tentemos descobrir um pouco do que somos, é importante rever o que desempenhamos nos grupos para assegurar nossa felicidade e favorecer a felicidade alheia.
Necessariamente não somos apenas o que fazemos para ganhar dinheiro e obter nosso sustento. Tendemos a ver muito de nós por meio da economia. A vida não se resume a dinheiro e sustento. Ela também é usufruto e algo além do desejo de consumir.
Uma das maneiras de buscarmos um conhecimento de nós mesmos é listar as atividades que temos, com as minúcias que conseguirmos. Uma pessoa que cuida de casa não está exclusivamente ligada às tarefas domésticas como algo monótono, repetitivo e que muitos julgam pouco importante. O que é preciso ver é que qualquer pessoa conversa com outras, ouve rádio, vê televisão, lê jornais, está na internet, entre outros contatos com o mundo. Esses contatos levam a demandas, que levam a mais contatos, o que determina muito da vida das pessoas. Elas vão se fazendo sociais e mostram suas identidades, ou seja, conhecem-se à medida que vivem.
Uma lista que se chame, por exemplo, “atividades e projetos” pode tranquilamente mostrar, de início, aquilo que diz respeito ao próprio local onde se mora. Uma necessidade de uma pintura em algum cômodo, um reparo numa calha, o replantio de alguma muda no jardim, qualquer dessas atividades define um pouco do que somos, não por elas em si, mas pelo modo como lidamos com a condução dessas atividades. Quem devemos procurar, como faremos, quanto gastaremos, o que deveremos providenciar para que as coisas sejam feitas, em que tempo, com que logística? Essas perguntas mostram a sistemática de nossa vida, nosso modo de ser e de encaixar as demandas da vida em nosso cotidiano.
Outro item da lista poderá ser a atenção com o automóvel que dirigimos. Num mundo em que temos que optar, muitas vezes, por transporte individual, será que é somente pegar o automóvel e sair guiando? Tudo o que diz respeito ao automóvel e como tomamos as providências para dimensionar a existência do automóvel em nosso cotidiano são coisas que também auxiliam a dizer como somos. Temos que lidar com as multas, a questão em grandes cidades do rodízio municipal para veículos, as taxas de licenciamento, a necessidade da vistoria ambiental, questões como seguro e manutenção, os cuidados com algo correlato às multas, que é o controle delas para que não seja ultrapassado o limite legal permitido dos pontos a ela referentes, o pagamento nas datas certas de taxas – infelizmente também das multas! -, para não haver sobrecarga à economia pessoal, assim por diante.
Mais um item para a lista podem ser as atividades de lazer. Dizem que também como encaminhamos nosso tempo livre ajuda a definir como somos. Isso é bem verdade, não apenas pela questão em si de escolher um destino para viagens, por exemplo, mas no modo como dimensionamos a logística para desfrutarmos nosso tempo livre. Quem deixa seus cães dentro do apartamento com uma bacia enorme de água e ração num pacotão, enche a sala de jornais e sai para viajar não tem a mínima consideração nem pelos animais nem pelos vizinhos tampouco pensa na repercussão dessa atitude na visão do síndico, que pode multá-lo. O pior é contar esse tipo de absurdo como se fosse piada a outras pessoas. O tipo de pessoa que se é, portanto, vai ser determinado pelo tipo de relacionamento e das decisões que se tem com as demais pessoas e seres que nos rodeiam.
A busca por conhecermos nossos jeitos de tratarmos as coisas pode auxiliar-nos na tentativa de alterarmos esses mesmos jeitos a fim de conseguirmos melhoras na vida. O autoconhecimento sempre é vantajoso, mas desde que notemos com atenção o que é repetitivo e o que se mostra diferente em tudo o que nos cerca. Para que possamos nos preparar para qualquer coisa, é preciso que saibamos os recursos de que dispomos e como utilizá-los. Se não notarmos direito o que fazemos e apenas utilizarmos improvisações e absurdos como saídas para situações, evidentemente estaremos à mercê das soluções alheias, ou seja, não conseguiremos avançar em nada.
Conhecermos como somos e o que podemos fazer com os nossos recursos são excelentes condições para estarmos posicionados adequadamente com nossa política pessoal no mundo.