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Estilística, Linguística do texto e Composição

   Estilística, Linguística do texto e Composição (*)

(In: BERNÁRDEZ, Enrique (compilador). Introducción a la lingüística del texto. Madrid, Arco, 1987, p. 131-150). Nils Erik Enkvist. (tradução do original espanhol para o português por Claudionor Aparecido Ritondale) Disponibilidade na border.com: Este título está fora de catálogo. Apesar de não estar disponível na editora, nós pesquisaremos em nossa rede de sebos para você e enviaremos uma posição atualizada dentro de uma ou duas semanas. Código (ASIN) ISBN:8423965015.

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            Os professores de composição, dizem George Dillon e seus colaboradores em um recente artigo de resenha, padecem de um “insaciável apetite de estudos linguísticos sobre o discurso” (Dillon et al., 1985: 458). Hoje em dia, este apetite realmente pode chamar-se insaciável, pois tem sido evidente desde o nascimento da retórica antiga. A ocupação de um retórico sempre foi articular os princípios do discurso em termos tão concretos e precisos, e tão linguísticos, portanto, quanto possível. Mas, até relativamente pouco tempo os linguistas estavam tão ocupados com os problemas no nível da oração e nos níveis inferiores que seus resultados eram de escassa utilidade para o retórico. Agora, todavia, a situação mudou graças ao rápido desenvolvimento da linguística do texto e do discurso. Muitos dos que trabalhamos no campo de estilo e do texto estamos de acordo em que se produziu um passo adiante na linguística que abre novas expectativas para os estudiosos da retórica e da composição. Os que querem apoiar a idéia de Dillon e convertê-la em um dito engenhoso poderiam dizer que os retóricos podem atirar-se agora sobre novas, suculentas e abundantes fontes de “Smörgåsbord” linguístico[1].

Este é o pano de fundo que favorece um enfoque novo e diferente das teorias da retórica, da estilística, da linguística de texto e do discurso, e a análise da conversação, da pragmática e talvez também outras áreas relacionadas com o estudo da linguagem como a sociolinguística e a psicolinguística, e de uma forma mais geral, a ciência cognitiva. Aqui tratarei brevemente das relações entre estilística, linguística do texto e composição escrita, talvez de uma forma tão pessoal que provoque objeções, e direi logo algumas palavras sobre a relevância que têm a estilística e a linguística do texto para o estudo, o ensino e a avaliação da composição escrita.

Em primeiro lugar, contudo, repassemos alguns dos problemas com os quais se deve confrontar um historiador da retórica e da estilística. A retórica poderia definir-se como a arte e a doutrina da comunicação efetiva. Nisto diferencia-se da gramática, doutrina da expressão correta; e da lógica, formulação e derivação das verdades. Mas o efeito de um discurso está sempre relacionado com um contexto em uma situação específicos; o que tem êxito em uma situação pode fracassar em outra. Assim, a retórica deve ser sempre uma disciplina dependente do contexto; deve considerar o discurso dentro do contexto, e não as orações ou as proposições isoladamente de forma independente do contexto. Para expressar as relações entre situação e discurso, os retóricos aprenderam logo a fazer observações sobre o decorum, sobre as variantes da linguagem condicionadas pelo contexto.  Mas ao fazê-lo passaram a ser estudiosos do estilo, pois sejam o que forem os estilos, são sempre variantes da linguagem dependentes do contexto.

Dos cinco processos retóricos clássicos na produção do discurso – inventio, dispositio, elocutio, memoria, pronuntiatio [2] – a elocutio resultou a mais determinante para a escolha de elementos linguísticos e alternativas estilísticas em cada situação específica. Durante os períodos em que aelocutio ocupou a maior parte da retórica à custa de outros processos, retórica e estilística puderam chegar a ser praticamente idênticas quanto a seu propósito e seu conteúdo, ainda que não necessariamente no nome. Em consequência, os historiadores da estilística devem contar com a história da retórica como parte integrante de seu território. Não menos óbvia é a larga e íntima relação de estilística, teoria literária e história literária, mas isto seria outro assunto, suficientemente complicado para ocupar toda uma larga série de conferências.

 

 

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            Muito mais recente é o matrimônio da estilística com a linguística moderna. Tem uma dívida tanto para com a busca, por parte dos estudiosos do discurso, de um aparato rigoroso, e portanto linguístico, como para com o desejo de alguns linguistas de estender seus domínios ao mais longe que puderem chegar suas doutrinas, inclusive mais além do que o nível da oração. Um tipo bem documentado de interesse pelas descrições exatas do estilo tomou forma na estatística e na métrica estilísticas (ver por exemplo Kenny, 1982). Mas também teve intenção de estender os princípios da linguísticas estrutural e descritiva a fenômenos considerados até então retóricos ou literários. Existe uma ampla bibliografia de teses acadêmicas sobre “linguagem e estilo” de autores ou textos específicos. Um movimento importante, devedor direta ou indiretamente da linguística, surgiu com o estruturalismo literário e suas sequelas de pós-estruturalismo e desconstrução. Mais relevantes para a história da estilística propriamente dita são as diretrizes surgidas do Congresso de Estilística de Bloomington de 1958 (Sebeok, 1960) e da discussão sobre estilo em Voprosy Jazykoznanija (Questões de Linguística), a revista soviética de linguística, nos anos 50. Logo apareceu um fluxo crescente de publicações sobre estilística linguística (entre as que podem servir de exemplo estão Enkvist, 1964, 1973 e 19740; revistas especializadas (Language and Style, Style, Lingua e Stile); seções de congressos, conferências monográficas e simpósios; e, em geral, mostras diversas de respeitabilidade acadêmica). Também em muitos planos de estudo apareceu a estilística como opção de especialização.

Mas tanto quanto a altura das saias, as disciplinas acadêmicas também têm suas modas. A estilística linguística no sentido moderno cresceu nos anos 50 e 60, mas logo teve que defrontar-se com rivais tão formidáveis como a linguística do texto e a análise do discurso, que entraram em cena nos anos 70 e 80. Obviamente, todas estas matérias operam no mesmo território. Poder-se-ia dizer que a linguística do texto e a análise do discurso cobrem e inclusive circundam a área cercada antes pela estilística literária, pela retórica e pela linguística tradicionais. Anda que os conflitos territoriais entre disciplinas sejam especialmente inúteis, sobretudo para gente prática mais afeita aos métodos centrados no problema que aos centrados na teoria (ver Evensen, 1985), elas acabam sendo interessantes para o historiador. Por isso falo hoje delas.

Ao falar de estilística vejo-me naturalmente obrigado a uma etiqueta que se atribuiu para coisas distintas em situações distintas. É conveniente portanto tentar definir o estilo. Se quiséssemos definir a estilística extensionalmente, deveríamos começar por fazer uma lista de todos os tipos de atividade que se têm empreendido sob o rótulo de “estilística”. Mas se o que pretendemos é encontrar as contribuições à estilística que têm aparecido com outras etiquetas, necessitaremos também de uma definição intensional. Como estou convencido de que os esforços mais interessantes na busca de uma definição intensional da essência linguística do estilo fizeram-se nos anos 50 e 60, tentarei enumerar alguns dos enfoques que alcançaram mais importância nessa época.

 

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            Se o vemos desde o sentido comum e na linguagem ordinária, um estilo é uma forma de fazer algo dentro de um conjunto dado de regras. Sem transgredir realmente o código de circulação, podemos conduzir um carro com estilos diferentes: com movimentos mais ou menos bruscos; de modo mais educado ou mais agressivo; mais ou menos colados à calçada. Ou então podemos construir duas estações ferroviárias que satisfaçam as mesmas exigências e que tenham os mesmos serviços mas que continuem parecendo diferentes. Poderíamos nos referir a essas diferenças dizendo que são estilísticas. Se uma perspectiva tão ampla do estilo como forma imposta a um conteúdo dado se traduz para aplicá-la ao mundo mais restrito da linguagem natural, o estilo acaba sendo uma certa forma definida de dizer ou escrever algo.

Precisamente onde se traça a linha entre conteúdo e forma nestes enfoques depende de nosso ponto de vista. Assim, digamos, dois compositores escrevem cada um uma ópera para festejar o aniversário da rainha, e um escolhe um tema antigo enquanto o outro, um moderno, poderíamos considerar legitimamente estes temas como parte do “estilo”. Os temas e os cenários são parte do modo pelo qual rendem homenagem os compositores. Mas esse enfoque do estilo aplica-se a um macronível semântico. Abstrações hierárquicas tão elevadas costumam ser de pouco interesse para o linguista, cuja atenção se centra na expressão concreta na linguagem natural.

Onde quer que situemos a fronteira entre conteúdo e forma, as definições de estilo como maneira de dizer ou escrever algo dão-nos já por indiscutível que existem diferentes modos de dizer a mesma coisa. Muitos lógicos e alguns linguistas estariam de acordo com isto. Afirmariam que existe uma diferença entre conteúdo e forma, e que uma mesma proposição ou predicação pode revestir-se de diferentes formas superficiais. Mas há outros que negam tal dualidade de significado e forma. Ao modo do New Criticism, afirmam que cada texto tem um único significado por si mesmo. Daí que todas as paráfrases, inclusive as mais insignificantes trocas na forma superficial de um texto, mudariam inevitavelmente seu significado. É este um enfoque monista.

Operativamente, o enfoque monista é mais simples que o dualista. Se quisermos saber se duas expressões diferentes “significam o mesmo” ou não, necessitaremos de uma semântica que possa distinguir variantes superficiais que signifiquem o mesmo, e variantes superficiais que não cumpram esta condição, e até agora ninguém tem sido capaz de oferecer ao estudioso do estilo uma semântica semelhante, disposta para sua aplicação rápida e simples. Por conseguinte, a definição de estilo como uma maneira de dizer algo apóia-se notadamente em intuições sobre a identidade ou diferença de significado, e tais intuições são notoriamente subjetivas e discutíveis.

Outro tipo de definição do estilo afirma que o estilo consiste em um halo decorativo de figuras estilísticas e outros adornos que rodeiam um núcleo de significado básico. Se tal definição há de traduzir-se em um método heurístico concreto, deveremos primeiramente aprender a distinguir dois significados básicos da decoração superficial.

Alguns estudiosos sugeriram que o estilo é o resultado de uma escolha. Tal enfoque parece intuitivamente bom. Todos podemos citar situações nas quais nos preocupamos em escolher palavras e expressões tratando de achar as melhores entre as oferecidas por um conjunto de alternativas possíveis. Para o investigador, a dificuldade firma-se em inventariar todas as escolhas de que disponha o falante ou escritor em uma situação particular. Há muitas classes de escolha. Algumas afetam a substância semântica, os significados e os matizes de significado; outras, os níveis de cortesia; e outras afetam as apreciações sobre a capacidade do receptor de extrair conclusões e ler entrelinhas. Inclusive no nível sintático, as gramáticas gerativo-transformacionais ou as gramáticas sistêmicas têm tido muito êxito ao oferecer-nos inventários completos de todas as escolhas hierárquicas e heterárquicas das quais surgem as orações. Quando ouvimos ou vemos realmente um texto, as escolhas já se realizaram: a investigação não pode prosseguir dispondo delas, exceto para o estudo de protocolos em certas situações específicas (por exemplo, um tradutor pode, em algumas ocasiões, elaborar uma lista das alternativas que se lhe ocorreram). Por isso, a operacionalização do enfoque do estilo como escolha estabelece problemas muito difíceis ao linguista.

Mais concreta para o linguista é a definição que se refere ao estilo como uma variante da linguagem condicionada pela situação. Em situações diferentes, as pessoas expressam-se de forma distinta, e o estilo é aquela variante da língua que se associa a uma categoria específica de situação. Usamos um conjunto de expressões em situações formais e outro em situações íntimas; um general usa um determinado tipo de língua quando se dirige a um tenente e outro distinto quando fala com sua esposa (ao menos é o que se espera!). Para operacionalizar este enfoque da análise estilística, o linguista deve aprender primeiro, todavia, a descrever e a classificar situações (Enkvist, 1980a). Deve aprender a extrair aqueles traços da situação estilisticamente relevantes dentre os numerosos traços existentes em qualquer situação normal de enunciação.

Agora poderíamos tentar fundir os enfoques do estilo como escolha e do estilo como variante situacional, e sugerir que os estilos são produto de uma determinada escolha de expressões determinadas pela situação. Um falante ou escritor opta por um estilo escolhendo entre várias alternativas à luz de uma situação específica. Também podemos adotar este método para des rever o que sucede no receptor, ouvinte ou leitor. A pessoa que conhece uma língua acumulou uma grande experiência de língua contextualizada e situacionalizada. Sabe como falam entre si os membros de uma família durante o desjejum, e talvez também como se dirige Shakespeare ao receptor ou aos receptores de seus sonetos. Tem uma grande habilidade para aplicar essas experiências passadas de língua contextualizada às condições presentes. Quando, quer ouça ou leia um texto novo, o confronta com experiências passadas relevantes, cria expectativas sobre o que virá em continuação, registra se se cumpriram ou não tais expectativas, e forma suas impressões sobre o estilo do texto como resultado do incremento destes processos combinados.

Para fazer tudo isto, um receptor deve dispor de uma rede de experiências passadas adequadas para os juízos estilísticos relevantes. Se, por exemplo, diferentes críticos literários partem de redes distintas e experiências passadas, seus juízos sobre o estilo de um mesmo texto podem ser diferentes, e se não existe tal rede, por exemplo ao aprender uma língua estrangeira ou pela escassez de experiência literária relevante, possivelmente não poderíamos julgar o estilo do texto. Isto ajudaria, diga-se de passagem, a quem se dedica a planejar os estudos de línguas estrangeiras. Se queremos proporcionar a nossos estudantes um sentido do estilo, deveremos proporcionar-lhes primeiro uma série de experiências que abarquem o campo dos textos e das situações de que necessitarão para obter as respostas estilísticas adequadas.

Se um linguista está de acordo com que os estilos surgem quando o falante ou escritor escolhe suas expressões para adaptá-las à sua situação, e quando o receptor julga estilos confrontando os textos com uma rede de experiências passadas de língua contextualizada, sua primeira tarefa será estabelecer um aparato capaz de modelar os processos relevantes em termos precisos. A maneira óbvia de imitar a gênese das respostas estilísticas é comparar a língua de um texto com a de outro texto, e precisamente com um que tenha a relação contextual desejada com o texto estudado. Definir a relevância de uma relação contextual não é assunto de estrutura linguística mas de relevância condicionada culturalmente. Na prática, o problema e a finalidade de cada um deve determinar onde se buscará o texto que proporcione a melhor comparação com o texto em questão. Para estudar o estilo das cartas de Byron, por exemplo, é provável que não consideraremos que comparar sua língua com a da lista telefônica de Londres vá resultar em algo de utilidade. Deveríamos comparar as cartas com outras cartas contemporâneas, com os poemas de Byron, e com outros elementos de comparação igualmente significativos. Deve-se notar, entretanto, que a escolha de uma norma com a qual vamos comparar um texto sempre predeterminará os resultados. Neste sentido, a estilística linguística acaba por contar com critérios extralinguísticos. O estilo é uma “interface”, uma zona de contato entre a língua e seu uso condicionado pela situação e pela cultura.

Para os que desejam ver mostras de análise assim, os estudos de atribuição de autoria constituem um bom objeto de estudo. Mostram de forma muito concreta que a comparação necessita primeiramente de uma limitação de texto e norma e, em segundo lugar, um aparato para descrever o texto e as normas com as quais o comparamos; e em terceiro lugar um conjunto de métodos que meçam a importância das semelhanças e diferenças surgidas da comparação. Todas estas operações apresentam seus próprios problemas. Às vezes a delimitação de texto e norma vem já dada e é evidente; outras vezes, deriva-se de um sofisticado processo de amostragem. Então, o aparato de descrição linguística deve ser adequado. Como muitos traços estilísticos não se acham dentro de orações individuais senão nas formas em que se enlaçam as orações dentro dos textos, as gramáticas oracionais simples resultarão inadequadas para a descrição de certas marcas de estilo importantes, e se a metáfora, as imagens e a retórica são características de um determinado texto, a descrição deverá valer-se de métodos capazes de revelá-las. Finalmente, para medir a importância das semelhanças e das diferenças entre texto e norma, podemos basear-nos bem na intuição ou na estatística. Por sorte, a estatística estilística é um campo bem desenvolvido da estilística, com seus próprios fiéis (seguidores) e sua própria e extensa bibliografia (por exemplo Kenny, 1982).

A comparação estilística é um método heurístico para o achado de marcas de estilo, as características estilísticas que proporcionam seu sabor estilístico a um texto. Uma marca de estilo poderia definir-se como um elemento, processo ou estrutura descritível linguisticamente cuja densidade, isto é, o número de ocorrências com respeito a alguma medida adequada de longitude do texto, é significativamente distinta, ou significativamente similar, à densidade correspondente de um texto definido como estilisticamente relevante, ou “norma”.

Os linguistas não têm ficado satisfeitos com meras descrições de conjuntos de marcas de estilo. Alguns têm tentado situar a variação estilística em sua perspectiva adequada dentro de um sistema de variantes linguísticas. Como se relacionam – perguntaram –, como interagem os estilos com as variantes históricas da língua, com os dialetos regionais, os socioletos e os idioletos: Se aparecem os estilos, não só por causa da ocorrência ou da ausência de marcas específicas, mas também pela densidade de tais traços, como podemos elaborar modelos sintáticos com regras “variáveis” dependentes da frequência? Ao considerar os estilos como “!mais ou menos” em vez de como um “sim ou não”, vincula-se a estilística àqueles modelos de descrição linguística que empregam categorias graduais e não apenas categorias discretas. Questões relacionadas com isto foram estudadas também nos anos 70 por William Labov e seus seguidores (por exemplo Labov, 1972b), por Henrietta Cedergren e David Sankoff (Cedergren e Sankoff, 1974) e por Charles-James Bailey e outros, cujas gramáticas poliletais tentavam atender sistematicamente a toda a escola de variantes da linguagem (Bailey, 1973). Quando se observam em sua totalidade, estes e outros estudos relacionados mostraram que de fato os estudiosos do estilo tinham muito em comum com os sociolinguistas e outros estudiosos das variantes linguísticas. Isto valia tanto para a metodologia como para os objetivos gerais. A partir desta perspectiva, parece como se a diferença entre estilolinguistas e sociolinguistas dependesse amiúde do marco departamental e da origem dos dados mais que dos métodos de investigação enquanto tais. Poder-se-ia dizer que uma predisposição literária favorece o termo “estilo”, enquanto que um contexto puramente linguístico ou sociológico faz com que predominem outros termos de “leto”, as variantes linguísticas.

 

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            Estes argumentos, e outros, conduziram a uma alta no “status” da estilística dentro do “stablishment” linguístico. De pronto, todavia, acelerou-se outro dos movimentos mais interessantes da linguística recente. Como há indiquei em várias ocasiões, isto deveu-se ao convencimento de que as descrições das línguas em termos de orações isoladas e descontextualizadas não poderiam nunca esperar revelar toda a autêntica essência da estrutura e do uso de uma linguagem natural. Uma oração não é um fim em si mesma. As orações aparecem em situações, aparecem encaixadas no discurso, estão rodeadas de orações e talvez imagens ou ações e gestos com os quais devem enlaçar-se. Há tipos de discursos, como a fala espontânea ou a poesia sintaticamente anômala, onde a continuidade e a coesão do texto são mais importantes que a boa formação sintática no nível da oração. Ainda que as orações desses textos pareçam incorretas sintaticamente, os textos continuam funcionando com êxito na comunicação. O texto, em outras palavras, é correto inclusive se sus orações não o são. (Existem, porém, condições específicas que devem ser satisfeitas: não podemos dizer Pedro golpeou a Paulo se queremos dizer que “Paulo golpeou a Pedro”.) Assim, para entender por que um falante ou escrito escolheu uma forma específica para uma determinada oração, devemos contar com todo o conjunto de estratégias do texto e com os enlaces dessa oração com seu contexto textual, discursivo e situacional.

Sugeri que os textos estão regidos pelo conjunto de suas estratégias textuais gerais. Estas estratégias realizam-se com meios táticos; a tarefa do léxico e da sintaxe é tornar possível a transmissão de informação na ordem, na sequência e na forma exigidas pela estratégia. Em outras palavras, a estratégia rege a formação das orações através da escolha tática de palavras e estruturas sintáticas. Também aqui, como nas guerras, a estratégia precede à tática: o texto é pai da oração, e não o contrário.

Utilizei aqui dois termos, “estratégia” e “tática”, que não fazem parte da terminologia tradicional da linguística. Faz-se conveniente portanto uma breve digressão conceitual. Uma tendência importante da linguística recente tem sido um interesse crescente pela descrição das línguas em termos de processo e não apenas em termos de estrutura. De fato, a palavra “processo” chegou a ser extremamente frequente em títulos de livros e de revistas de linguística, e podemos falar justificadamente da aparição de uma nova linguística processual (ver por exemplo Allen, 1982 e Eikmeyer, 1983). Uma vez comprometidos a enfocar a língua como processo, também temos a obrigação de desenvolver um aparato adequado para a descrição processual, e para tal aparato necessitaremos de conceitos como “estratégia” (definível como avaliação, determinada pelo objetivo, das diferentes alternativas entre as quais deve escolher) e “tática” (na formação de textos em linguagem natural, a escolha de palavras, esquemas sintáticos e oracionais e outras estruturas textuais que ajudem a cumprir melhor as exigências da estratégia textual). Um lugar em que é preciso tomar uma decisão entre alternativas diferentes é um “ponto de decisão” e os parâmetros cujos valores afetam a decisão poderiam rotular-se “parâmetros de decisão”. Em um marco processual semelhante, poder-se-ia tentar uma redefinição de estilo como avaliação de parâmetros de decisão determinada pelo contexto. Na poesia de métrica regular, por exemplo, as exigências do metro podem ser suficientemente importantes como para alcançar primazia sobre as exigências da boa formação sintática: a metricalidade chega a ser um fator ou um parâmetro altamente avaliado ao qual tem que se submeter inclusive a sintaxe, e o resultado é um texto sintaticamente incorreto mas metricamente satisfatório.

Outro exemplo. Quando um escritor de livros de cozinha desloca para a esquerda um advérbio de lugar, inclusive com o verbo put (pôr), cujo deslocamento costuma ser muito raro em outros casos (como em Into a champagne glass put two lumps of sugar “em uma taça de champanha pôr dois torrões de açúcar”) (*), esta ordem tão marcada deve-se aparentemente à importância de converter uma oração no ícone de um acontecimento. Esta “iconicidade experiencial” (Enkvist, 1981) é especialmente importante no sucinto estilo operativo de um livro de cozinha. A oração anterior é uma abreviação de “primeiro tome-se uma taça de champanhe e em seguida ponha nela dois torrões de açúcar”: menciona a taça de champanha e os torrões de açúcar na ordem em que deles vai precisar o cozinheiro. Converte a oração em um isomorfo, uma imagem, um ícone, da experiência. Desta maneira, metricalidade e iconicidade experiencial são dois dos parâmetros da estratégia do texto que podem avaliar-se de forma muito distinta em estilos diferentes associados a diferentes tipos de texto, como poesia ou livros de cozinha: em poesia, a metricalidade pode submeter à sintaxe; no sucinto estilo operativo, a iconicidade experiencial pode justificar o uso de esquemas sintáticos oracionais muito marcados. Tais argumentos motivam uma definição dos estilos como algo que surge mediante esquemas específicos e característicos de avaliação dos princípios e dos parâmetros da estratégia textual que afetam à aparência do texto.

Mas isto era uma digressão com a qual tentei exemplificar a aplicação dos enfoques processuais (que são favorecidos por algumas escolas sintáticas mas também, e muito, pela linguística do texto e do discurso) à definição de estilo e estilos. Voltemos a meu argumento principal. Pessoalmente vi-me envolto nestes problemas textuais e discursivos nos anos 60 porque já tinha como evidente que os estilos podiam diferir não apenas pela estrutura das orações mesmas, mas também pela forma em que se uniam umas orações com outras. Portanto, fazia falta uma ferramenta linguística que pudesse descrever os enlaces entre orações. Entre os estudos disponíveis que poderiam ser relevantes dominavam as investigações sobre tema e rema da Escola de Praga, ainda que naquela momento o papel de tema e rema no enlace das orações e na realização tática das estratégias textuais não tinha recebido valorização de forma adequada. Ao mesmo tempo, e mais paradoxalmente, a gramática gerativo-transformacional estimulou também a ling6uística do texto. o paradoxo reside no fato de que de todas as gramáticas têm sido as gerativo-transformacionais as mais centradas na oração. Ou era seu símbolo de partida e a oração era seu teto: em suas formas clássicas, eram incapazes de descrever nada mais abaixo ou mais acima da oração. Sua relevância surgiu de outra de suas características principais; a exigência de explicitamento. As transformações tinham que descrever-se com detalhes completos e explícitos, incluindo o que as punha em funcionamento, e logo se viu que a causa de várias transformações não estava na oração senão fora dela, no discurso, no texto e na situação. Uns poucos exemplos: a passiva com agente explícito deve seu uso habitualmente à necessidade de ressaltar um paciente ou objeto por razões discursivas(**). Uma oração como

 

The sandwiches were eaten by John

“Os sanduíches foram comidos por John”.

 

 

 

pareceria estranha como resposta a “Que comeu John?”, mas muito mais natural como resposta a: “Que aconteceu com os sanduíches e as maçãs que deixei na mesa?”. Uma topicalização como

 

This book I have read three times

“Este livro li-o três vezes”

 

pareceria natural se, por exemplo, o falante apontasse um dos livros que estivessem diante dele sobre a mesa. Uma construção existencial como

 

There were two typewriters on a mahogany table

“Havia duas máquinas de escrever sobre uma mesa de mogno”

 

deve sua forma a uma situação na qual o falante ou escritor não dispõe de informação anterior sobre a qual apoiar a informação nova. Uma construção truncada como

 

It was at seven that Mary came to Trondheim on Monday

“Foi às sete que Mary veio a Trondheim segunda-feira”

 

só está motivada se o falante ou escritor pressupõe que o receptor já sabe que Mary veio a Trondheim segunda-feira: usa a construção truncada para mostrar que a informação nova, ao contrária das estratégias mais habituais não marcadas, ocupa uma posição adiantada e não retardada na oração. (Na língua falada temos além desta a opção de marcar a informação nova com ajuda do complexo acento de entonação: ver, por exemplo, Enkvist, 1980b). Uma extraposição como

 

It known to everybody here that Trondheim Cathedral counts as the national shrine of Norway

“É sabido por todos aqui que a Catedral de Trondheim se considera o santuário nacional da Noruega”

 

diante de

 

That Trondheim cathedral counts as the national shhrine of Norway is known to everybody here

“Que a Catedral de Trondheim se considera o santuário nacional de Noruega é sabido por todos aqui”

 

deve-se também a uma escolha estratégica: estamos falando da Catedral de Trondheim como discurso de tema já estabelecido, ou queremos introduzi-la em nosso discurso como elemento novo?

A escolha de todas estas estruturas (ou, em termos de gramática gerativo-transformacional, a motivação das transformações que as produzem) deve-se portanto a motivos ou avaliações surgidos de estratégias de contexto e situação. O linguista que quiser explicar tais realizações táticas das estratégias textuais pode proceder de duas maneiras. Pode introduzir formantes textuais na descrição das orações, ou converter-se em linguista textual e discursivo e trabalhar abertamente com estratégias textuais. As dificuldades de explicar as forças textuais introduzindo-as pouco a pouco na descrição das orações aparecem de maneira evidente na história da gramática gerativo-transformacional. Várias das revisões e ampliações de seus formatos foram impulsionadas, efetivamente, pela necessidade de explicar os disparadores das transformações textuais.

Para dar um certo aspecto de ordem em uma aparente complexidade, voltarei a referir-me aos textos e às teorias textuais a partir de quatro rótulos. Chamei à primeira categoria de modelos textuais, “baseados na oração”. Os modelos textuais baseados na oração aceitam um texto tal como é, sem forçar suas orações e suas proposições, tratando assim de descobrir os traços que enlaçam orações e proposições entre si. Cohesion in English, de M. A. K. Halliday y Ruqaiya Hasan (1976) é um bom exemplo de uma aproximação de caráter fundamentalmente baseado na oração.

Os que possuam mente inquisitiva logo perguntarão, porém, de onde vêm as orações e por que estão formadas de uma maneira e não de outra. Não ficarão satisfeitos com um modelo textual baseado na oração, que fracassa na hora de solucionar tais questões. Seguirão construindo modelos textuais que surgem de alguma espécie de átomos textuais, as unidades básicas do texto que se combinam para formar textos de acordo com estratégias definidas e explícitas. Se simbolizamos estes átomos textuais com predicações, poderíamos rotular este modelo como “baseado na predicação”. Uma mesma série de predicações podem textualizar-se em textos diferentes com estratégias diferentes: os textos baseados em uma mesma série de predicações se considerarão variantes uns dos outros. Modelos baseados na predicação tem sido desenvolvidos, por exemplo, por Bengt Sigurd (1977) e Gunnel Källgren (1979) na Suécia e por Robert Longrace (1983) nos Estados Unidos. Métodos para a reconstrução de conjuntos de predicações subjacentes de textos tem sido elaborados por van Dijk y Kintsch (por exemplo 1983) e outros: utilizam o termo “base textual” para uma série tal de proposições. Mas ainda restam problemas.

Se perguntarmos como nascem as predicações necessitaremos de um terceiro tipo de modelo, capaz de extrair predicações de um arquivo de conhecimentos. Como tais arquivos de conhecimentos se convertem em modelos cognitivos humanos, poderíamos chamá-los modelos textuais cognitivos. Modelam o armazenamento de informação em forma de marcos ou esquemas ou “scripts” ou coisas semelhantes, normalmente em forma de redes de associações (Findler, 1979). Psicolinguistas e psicólogos cognitivos tentam tornar realistas eus modelos, no sentido de fazer com que reflitam suas experiências empíricas do processamento da informação humana real. Os que trabalham com inteligência artificial estruturarão, por sua vez, o armazenamento de informação e sua recuperação segundo o que parece natural para os computadores.

Finalmente, podemos perguntar-nos por que uma pessoa em uma situação dada opta por expressar-se de uma forma determinada. Por que extrai certas predicações específicas de seu arquivo de conhecimentos e as textualiza?  Em sua textualização por quais mecanismos de cortesia opta e por quê? Circunda seu texto de metatexto, modalidades, expressões fáticas e coisas semelhantes? Como coordena seu comportamento com o de outros no diálogo? Para responder a perguntas deste tipo, os modelos textuais baseados na oração, os baseados na predicação e os cognitivos mostrar-se-ão insuficientes. Necessitaremos de um quarto tipo de modelo textual, que poderíamos chamar interacional. Pragmalinguistas como Stephen Levinson têm explorado grande parte deste território (Levinson, 1983) e têm dado numerosas contribuições os estudiosos da etnometodologia, da análise da conversação e de outros campos (por exemplo, Sacks Schegloff e Jefferson, 1974; Labov e Fanshel, 1977; Tannen, 1984).

Estes modelos textuais relacionam-se entre si como caixas chinesas ou matriúscas[3]  russas mais do que como as camadas de um pastel. Todos eles participam no conjunto da réplica de um ato de comunicação. Os modelos interacionais mostram como se comportam as pessoas, e talvez até certo ponto por quê. Quando uma pessoa optou por uma estratégia interacional específica, pode começar sacando de seu arquivo cognitivo coisas a dizer, tal como as modelam os modelos cognitivos: pode textualizar assim suas predicações, como se vê nos modelos baseados na predicação; e pode enlaçar suas orações proposições entre si tendo em conta as formas sugeridas pelos modelos textuais baseados na oração. Todavia, não deveríamos forçar demasiado tais distinções sequenciais entre estes tipos de modelo. A interação, por exemplo, pressupõe a cognição, porque nosso conhecimento de como nos comportar e interagir com outros forma parte de nosso arquivo cognitivo; mas para o estudioso dos modelos e das teorias textuais, uma classificação assim é de grande ajuda, convida à comparação com os processos de inventiodispositio e elocutio da retórica clássica.

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            Então, como se relacionam entre si estilística e linguística do texto? Como se entrosam e se superpõem?

Assinalarei muito brevemente que o estilo nunca foi objeto favorito de estudo linguístico. Quer dizer, o estilo pode definir-se sempre em termos de outros conceitos mais básicos, como tentei demonstrar ao citar diversas definições de estilo. A linguística do texto e do discurso nos proporciona um novo conjunto e conceitos para a definição e a explicação do estilo, e esses conceitos podem obter-se das quatro categorias de modelos textuais. Assim, os modelos textuais baseados na oração nos permitem descrever as marcas de estilo que constam de traços interacionais mais que de traços sintáticos e léxicos das orações individuais. Os modelos baseados na predicação nos permitem descrever estratégias textuais e estabelecem assim mesmo a questão de até que ponto o conceito de estratégia textual pode identificar-se realmente com o conceito de estilo: em que sentidos a estratégia textual é precisamente outro termo para “estilo”? Os modelos textuais cognitivos mostram como a cognição humana afeta os estilos e como a adaptação dos processos de produção do texto e de compreensão do discurso às capacidades humanas afeta a forma do texto e do discurso. Finalmente os modelos interacionais nos proporcionam um repertório de parâmetros interacionais que regem a escolha estilística: ajudam-nos a compreender em que circunstâncias interacionais os falantes ou escritores preferem uns tipos de expressão a outros.

Voltando a nosso ponto de partida: é perfeitamente natural que todas estas aquisições territoriais no estudo do estilo e do texto tenham trazido consigo novas esperanças, não só aos acadêmicos, mas também aos professores de composição. Não menos lógico é que as inovações dêem lugar a picos de otimismo que podem converter-se em abismos de pessimismo[4] à medida que se vai avançando e se vão derrubando os entusiasmos iniciais, pois a composição é um processo mito complicado. Estabelecer correlações entre avaliações intuitivas e traços linguísticos concretos de um texto exige uma grande sofisticação, e algumas experiências recentes mostram que o estudo da composição tem resistido à aplicação simplista da linguística do texto e do discurso. Seria incorreto, por exemplo, dar por suposto que a simples densidade dos enlaces inter-oracionais  é diretamente proporcional às escalas impressionista. Há composições pobres com uma elevada densidade de enlaces coesivos explícitos entre as orações e, ao contrário, ensaios magníficos que se baseiam em procedimentos de coerência que não são os enlaces gramaticalmente explícitos, quantificáveis e evidentes. O que é de valor duvidoso é o inventário indiscriminado de mecanismos díspares. Por exemplo, um inventário mais específico de enlaces causais como porqueportanto, etc. dir-nos-á provavelmente algo sobre o uso de argumentos causais pelo escritor (supondo, desde logo, que estes conectores expressam o que entendemos que expressam os enlaces causais). Se o texto é do tipo em que os argumentos causais estejam favorecidos, o número dos conectores causais utilizados corretamente pode proporcionar-nos chaves de sua qualidade.

Assim, os critérios de avaliação textual tem-se mostrado ser mais escorregadios e insensíveis à abordagem linguística do que esperavam alguns entusiastas. Há duas reações possíveis diante de tal decepção. Uma provocaria o desespero de toda a linguística. Para citar um douto colega: “O mal de nossos estudantes não é que não conheçam a língua ou sua linguística, mas que não sabem pensar”. Essa atitude permite rechaçar a linguística como inútil. A outra resposta seria: “É verdade, os linguistas não resolveram nossos problemas, mas nos ajudaram com algo em nosso campo. Assim basta que continuemos a partir daqui e tratemos de melhorar nossa linguística para ver se conseguimos chegar a algo mais longe”. Neste congresso, suponho que a maioria de meus ouvintes adotaram esta última postura, que eu compartilho por inteiro. De outro modo não teríamos por que ter vindo aqui.

Creio que se tem que aplaudir essa postura de otimismo cético, ainda que não seja fácil adotá-la. Entre outras coisas pressupõe um clima que favoreça a colaboração entre linguistas do discurso e professores de composição. Os linguistas deveriam dizer aos professores algo sobre teoria, em voz baixa; os professores deveriam confiar suas aflições aos compreensivos linguistas; e juntos deveriam idear sistemas de resolver os problemas e, mais ainda, desenvolver novas teorias aí onde as existências resultem demasiado curtas para suas necessidades.

Isto é muito fácil de dizer, mas bastante mais difícil de conseguir. O ensino da composição segue considerando-se, todavia, muito frequentemente como um trabalho necessário, mas humilde, e no pior dos casos repulsivo, um tanto como o negócio de saneamentos. Em muitos departamentos universitários, as classes de composição se vêem como um trabalho imundo que permite ao que o realiza comprar o direito de desfrutar de ensinamentos mais interessantes e prestigiosos durante o resto de sua carreira docente. Há relativamente poucos lugares onde se tenham feito sérios esforços para preencher a lacuna entre linguística e ensino da composição. Igualmente, têm sido relativamente escassos os esforços sérios de preencher o vazio entre língua e literatura mediante a correção sistemática, ainda que as habilidades linguísticas também incluam experiência da língua em contextos literários. Os problemas são suficientemente familiares, e sobre eles se escreveu um número considerável de animadores ensaios (por exemplo, Lanham, 1984; Young, 1984).

 

============fim do texto de Enkvist ==========================

 


(*) Este artigo é aula inaugural do Primeiro Simpósio “Nordtext”, celebrado em Trondheim, Noruega, em agosto de 1985. Aparece publicado (junto com outras comunicações para o mesmo congresso) no número monográfico da revista Text intitulado “Text Linguistics and Written Composition”  (“Texto Linguístico e Composição Escrita”), volume 54, 1985, páginas 251-267). Reedita-se aqui com autorização do autor. A tradução (para o espanhol) é de Juana Teresa Guerra, revisada por E. Bernárdez. Suprimiu-se o último parágrafo, que resumia os temas das comunicações apresentadas no Simpósio.

 

[1] No texto espanhol não houve tradução da palavra “Smörgåsbord”, que é uma composição formada pelo verbo norueguês “smiger”, adular, honrar, e “bord”, mesa. Por extensão, tem-se a idéia de banquete (algo oferecido numa mesa) como forma de adulação, ou honra, portanto, “banquete de honra” (nota do tradutor para o português). Em verdade, “Smörgåsbord”, na culinária, tradicionalmente era mesa fria sueca ou hors d’oeuvre (alimentos, em geral picantes ou condimentados – como, por exemplo, rabanetes, azeitonas, picles –, que se ingerem como aperitivos antes do almoço ou do jantar; em português de Portugal, há a palavra “acepipes” usada como sinônimo; no Brasil, poderia ser “tira-gosto” – se bem que o palavra smörgåsbord seja mais elaborado, é como se fosse uma mesa de rodízio, com vários pratos). No passado, era costume os convidados trazerem alguma comida para dar uma contribuição à mesa fria  ou Smörgåsbord. A tradição do Smörgåsbord  ainda existe, sem a contribuição de algum convidado. Almoços e jantares na Suécia são comumente precedidos por salada de arenque e queijo ou por sanduíches abertos ou talvez por arenques em conserva com pão e manteiga. Nas ocasiões festivas, como o Natal, o “Smörgåsbord”  é muito rico, com uma grande variedade de pratos, incluindo muita carne e peixes em conserva. Algumas vezes, apresenta um prato quente. Os suecos têm um grande cuidado na apresentação do alimento, e suas decorações são bastante elaboradas.   O Instituto Brasileiro Escandinavo de Intercâmbio Cultural – IBEIC – de Porto Alegre, Brasil, que promove jantares mensais com a culinária típica dos países nórdicos, define assim o prato típico: “A comida mais representativa da culinária sueca é o Smörgåsbord, que é uma variedade de pratos com peixes (salmão assado, salmão marinado, arenque em conserva, peixe defumado, etc.), carnes (porco, gado, ovelha), queijos, legumes, pães (hårtbröd, etc), totalizando mais de 100 variedades”. O Smörgåsbord, hoje, é uma refeição completa: todos os pratos são colocados juntos sobre uma grande mesa, dividida em três setores: pratos gelados, com grande variedade de peixes preparados de diversas maneiras; pratos frios, compostos de carnes e saldas de legumes; e pratos quentes. Vários tipos de pão acompanham a refeição, onde não podem faltar a manteiga e o creme de leite temperado com dill, o tempero favorito dos escandinavos. O arenque é o destaque do Smörgåsbord, podendo aparecer várias vezes, em várias formas e sabores. A metáfora, no texto de Enkvist, significa que se estaria diante de uma imensa variedade de pratos sofisticados, como numa espécie de “rodízio” bem apresentado de uma “culinária” linguística de alto nível, enfim, um banquete de honra linguístico, onde se comem bem e fartamente diversos tipos de pratos sofisticados, à livre escolha do usuário. (nota do tradutor para o português).

[2] As partes componentes do sistema retórico para os gregos eram quatro – a inventio, a dispositio, aelocutio e a actio (pronuntiatio) – às quais os romanos acrescentaram mais uma, a memoria. Ainventio é a retórica do conteúdo, o estoque do material, de onde se tiram os argumentos, as provas e outros meios de persuasão relativos ao tema do discurso; a dispositio é a maneira de dispor as diferentes partes do discurso, a organização ou plano interno do mesmo (com os componentes: exórdio, proposição, partição, narração ou descrição, argumentação – confirmação ou refutação – e peroração); a elocutio é o estilo ou as escolhas que podem ser feitas no plano da expressão para tornar adequado o conteúdo, tratando das virtudes do bem dizer – correção, clareza, concisão, adequação e elegância –, além das modalidades de estilo – simples, médio e sublime; a actio (no texto de Enkvist tratada como pronuntiatio) é a ação que atualiza o discurso, ou seja, a sua execução, o momento de falar (pronunciar), para o qual colabora o ritmo, a pausa, a entonação, o timbre de voz e a gestualidade, além da presença do auditório, o que faz ganhar corpo a emoção; finalmente, amemoria é a retenção do material a ser transmitido, para a qual colaboram os processos mnemônicos, a coerência interna do discurso, sua lógica e o bom ritmo das frases (nota do tradutor para o português, adaptando trecho de MOSCA, Lineide L. S. (org). Retóricas de Ontem e de Hoje, São Paulo, Humanitas, FFLCH-USP, 1999, pp. 28 e 29) (Nota do tradutor para o português).

(*) A argumentação de Enkvist refere-se logicamente somente ao inglês; a ordem desta construção é muito menos marcada e mais habitual em espanhol.

(**) Também aqui os fatos sintáticos são distintos em espanhol. Não tento uma adaptação, desnecessária em minha opinião para o conjunto da argumentação, aos fatos do espanhol e mantenho a tradução puramente literal dos exemplos. Para o primeiro, por exemplo, uma tradução mais correta seria “Os sanduíches se os comeu Juan”, mas as transformações que teria que ter em conta são distintas das que aparecem na oração inglesa.

[3] Matriúscas são bonecas pintadas em forma de potes, ocas e em vários tamanhos, encaixadas ao meio, de forma que possam encaixar-se as menores dentro das maiores, sendo que a maior encerrará todas as outras com as respectivas partes de cima, que se comportariam como tampas. (nota do tradutor para o português).

[4] No texto espanhol há um jogo entre as palavras “cimas” (cumes, picos) e “simas” (furnas, abismos), impossível de reproduzir na tradução. (nota do tradutor para o português).

 

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Claudionor Ritondale

Claudionor Aparecido Ritondale, nascido em São Paulo, em 1957. Casado, pai de uma filha, amigo de cães, apreciador de vinhos. Mestre em Língua Portuguesa, com sólidos conhecimentos em Português e na área da Educação. Escritor premiado, com 41 livros editados e vários artigos sobre vários assuntos – poesia, contos, língua portuguesa, filosofia, viagens, crítica literária e de artes, administração. Revisor de textos, professor de Metodologia do Trabalho Científico. Faz palestras, ministra cursos e participa de videoconferências sobre o novo acordo ortográfico, ministra cursos de língua portuguesa pela internet. Autor de apostilas de Filosofia, Sociologia, Língua Portuguesa, Redação, Interpretação de Texto e Literatura para o ENEM. Tradutor de italiano, inglês, espanhol, francês e alemão, para particulares, empresas e editoras (textos técnicos e literários). Aposentado de um banco estatal, com experiência em programas de Treinamento e Desenvolvimento e universidade corporativa. Copyright © 2012 Claudionor Ritondale

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